Infectologista
Maria de Lourdes Worisch, diretora técnica do Hospital Brasília |
Pandemia obrigou hospitais a reinventar processos, procedimentos e forma de convivência com pacientes e equipes
Humanização, cuidado, segurança e acolhimento se tornaram as principais bandeiras das instituições
A
pandemia de Covid-19 forçou a criatividade de diversos setores produtivos e de
serviços. Mais do que isso, se houve uma instituição que precisou se reinventar
totalmente nesta pandemia, foram os hospitais. Otimizaram e criaram vários
rituais de gestão para respostas ágeis e em tempo real, inicialmente de segunda
a segunda. Vários pilares deram sustentação em vários níveis ao Comitê de
crise: planos de expansão, logísticas de suprimentos e equipamentos, recursos
humanos, comunicação interna e externa, comitês de especialistas só para citar
alguns.
De
um lado, equipes internas esgotadas, estressadas, vivenciando suas próprias
dores e que ainda tiveram que se adaptar rapidamente a novas rotinas, novos
conhecimentos, novas formas de trabalho. Tudo isso em tempo real, com
alterações diárias, às vezes em algumas horas, com treinamentos constantes. De
outro lado, pacientes e familiares vivendo também ansiedade, medo, dor,
solidão, luto sem despedida e traumas psicológicos.
“A
crise sanitária mundial que vivemos mudou a lógica da operação, mudou o modus
operandi, tivemos que criar vários hospitais em um só. Para os profissionais de
saúde, foi o momento de trazer à superfície a nossa mais essencial missão:
cuidar do outro”, explica a médica infectologista Maria de Lourdes Worisch,
diretora técnica do Hospital Brasília.
Novos
problemas, novas soluções
A
solução para problemas que antes não eram tratados como prioritários passou a
ser essencial, e quem soube compreender a nova realidade conseguiu atender – e
acolher - melhor tanto o paciente quanto a própria equipe. O medo e as dúvidas
dos pacientes obrigaram a ampliação e modernização da forma de conectar paciente
e corpo clínico. A comunicação digital, a possibilidade de tirar dúvidas por
telefone e a telemedicina, ainda em implantação em muitas estruturas de saúde,
se tornaram vitais.
Simultaneamente,
o olhar para o controle de infecções por meio de novas formas de treinar os
colaboradores foi o ponto de partida para evitar o pânico entre as equipes.
“Quem toca no paciente, precisou se reinventar” explica Maria de Lourdes. As
formas tradicionais de treinamento se transformaram também. As equipes que já
estavam trabalhando precisaram ser ‘retreinadas’, com a tutela de profissionais
mais experientes, mas que também enfrentavam um novo ‘inimigo’.
O
controle de infecção precisou ser totalmente redefinido. As regulamentações
foram mudando. Foi remodelada a forma tradicional de compartilhar e treinar
profissionais de saúde. Protocolos de limpeza, rotas até o centro cirúrgico,
unidades de terapia intensiva e internação foram alterados quase diuturnamente.
Quem soube se adaptar, enfrentou a pandemia de maneira mais eficiente e
humanizada.
Lições
da pandemia
A
infectologista revela que o sofrimento vivido diariamente com a pandemia trouxe
duas grandes lições: “a primeira e mais definitiva é o cuidado com quem cuida;
a segunda, a importância da humanização na assistência ao paciente que fica
isolado, sem acompanhante, sem contato com o mundo exterior”, explica. Ela
acrescenta que a utilização da tecnologia, com os smartphones ou tablets
funcionando como via de acesso à família, os momentos de encontro com
familiares nas varandas, as festas de despedida para quem vence a doença,
mensagens e cartazes tornaram a convalescença um pouco menos penosa.
A
interação entre os profissionais que trabalham diretamente no tratamento da
doença também precisou ser melhorada. O Hospital Brasília investiu na criação
de um grupo de profissionais de diversas especialidades. “Fizemos reuniões com
mais de uma centena de profissionais para garantir um protocolo de tratamento
que enfrentasse dilemas éticos e trabalhasse com as diretrizes da instituição.
Houve suporte científico, com informação sempre acessível, atualizada e uma
grande preocupação com a capilarização de todas as novidades no tratamento da
doença, comenta a diretora técnica.
Para
um grande desafio, grandes inovações. Ainda hoje, mais de um ano após o início
da pandemia, há muito o que aprender na convivência hospitalar com a doença.
Por isso, o Hospital Brasília fortaleceu o grupo de profissionais que dá
suporte ao restante da equipe. “À medida que surgiam – e surgem – necessidades
específicas, novos especialistas se incorporam ao grupo”, explica Maria de
Lourdes. A ideia é que a inovação e a reinvenção não parem e que a saúde mental
de pacientes e colaboradores esteja sempre em foco. “Quando a pandemia se for,
com certeza, esse novo olhar vai permanecer”, conclui.