O uso das redes sociais na política


Entenda quais os cuidados que líderes políticos precisam ter ao utilizar as mídias digitais


O uso das redes sociais por figuras públicas tem se tornado um requisito cada vez mais forte por políticos de todo o mundo. A eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, ou a mais recente de Narendra Mondi, na Índia, foram motivadas principalmente pelo uso intenso das plataformas digitais. Entretanto, quais os limites e precauções que um chefe de Estado precisa ter ao utilizar tais meios para se comunicar?

A eleição de Jair Bolsonaro (PSL) para presidente do Brasil não foi diferente. Ele mesmo declarou, em entrevista exclusiva à revista Veja, que a comunicação via redes sociais foi muito importante no sucesso de sua campanha. “Acho que sou a pessoa que consegue atingir mais gente no mundo, tem mais interações, mais engajamento”, disse.

Apesar de não ser reconhecido como a pessoa que mais consegue engajamento no mundo, os números do atual líder do executivo nas redes sociais não são nada baixos. A página no Facebook, onde realiza as lives semanais, tem mais de 9,5 milhões de curtidas. A última transmissão ao vivo, por exemplo, recebeu 987 mil visualizações. No Instagram, o número de seguidores sobe para 12 milhões.

No Twitter, entretanto, é onde tem surgido as maiores críticas. Os 4,4 milhões de seguidores da rede já passaram por diversas situações de constrangimento, como o famoso vídeo “O que é Golden Shower?”. De acordo com levantamento feito pelo jornal Nexo, entre 1º de janeiro e 12 de abril, o peesselista tuitou 612 vezes (média de seis por dia) e deu outros 156 retuítes.

Doutora em comunicação, Luciane Agnez avalia pelo menos três pontos em que a rede está sendo utilizada de maneira errônea pelo presidente. A começar pelo uso exclusivo do Twitter em detrimento do não uso de outros veículos, como a imprensa ou outros meios de comunicação. “A gente tem uma expectativa de que uma rede social alcança muita gente, mas não alcança”, diz a professora de jornalismo.

De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a PNAD Contínua, o percentual de domicílios que utilizavam a Internet foi de 74,6% em 2017. Considerando as 181,1 milhões de pessoas com 10 ou mais de idade, o número se reduz para 69,8% que usaram pelo menos uma vez nos três meses anteriores à pesquisa. A taxa se restringe ainda mais se formos falar de Twitter. A rede social do passarinho azul é a sexta preferida dos brasileiros e abrange apenas 43% dos usuários que tem acesso à internet, segundo dados de 2019 da Hootsuite.

Um segundo ponto que a professora contesta é que o uso abusivo e único das redes sociais, desprezando veículos de imprensa, acaba gerando uma comunicação de mão única. Logo, não existe contraposição e muito mesmo debate. Ela compara com a comunicação de regimes totalitários. “Se negar qualquer espaço de contraditório, e só falar em tom de relações públicas, é claro que isso tem ar ditatorial”, explica.

Luciane Agnez, doutora em comunicação

Luciane ainda apresenta um terceiro comportamento do presidente que gera conflito na comunicação presidencial: o uso da plataforma de forma pessoal. “Quando Bolsonaro está nesse posto [de presidente da República], ele não deve fazer uma comunicação da pessoa física, mas uma comunicação de Estado”, comenta a professora.

“Brincar todos podem, desde que não cause um problema diplomático, um processo de desinformação ou mesmo contrarie o próprio Diário Oficial da União”, conta a professora, fazendo referência ao caso do “Golden Shower”. Ela explica que a “brincadeira” pode ter sido utilizada para abafar uma determinada situação. Segundo o levantamento do Nexo, a respectiva citação foi uma das que mais receberam interação no período analisado.

Leonardo Volpatti concorda com a crítica de Luciane. O advogado e cientista político especializado em análise de dados acredita que deve existir uma “liturgia” no que se deve ou não postar nas redes sociais por figuras públicas, principalmente pelo chefe do Executivo. Leonardo fala sobre uma diferenciação que deve existir entre a pessoa Jair Bolsonaro e o presidente da República.

“Apesar de Bolsonaro ter vindo de um movimento surgido nas redes sociais, no momento em que ele está investido no cargo, tem que seguir a liturgia e os posicionamentos de um presidente da República”, afirma. Ele considera o comportamento do peesselista como algo problemático para o país.

Leonardo Volpatti, advogado e cientista político especializado em análise de dados

Volpatti ainda lembra que, junto aos algoritmos, o risco da ação se multiplica e produz as chamadas “bolhas ideológicas”. A ferramenta GPS Ideológico, da Folha de S. Paulo, analisou 1,7 milhão de usuários brasileiros com interesse em política no Twitter e monitorou o debate na rede social. Uma das conclusões que chegaram é que tanto usuários radicais de esquerda no Twitter, quanto de direita seguem poucas pessoas fora de seus grupos ideológicos e pouco compartilham mensagens de perfis de outros segmentos.

O caso de Bolsonaro é semelhante. A conclusão do levantamento é que o líder do Executivo privilegia radicais de direita em rede social, a maioria sendo base do escritor Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo. Segundo os dados, 35% das pessoas que Bolsonaro retuíta estão entre os 5% mais à direita do GPS Ideológico.

“Se você é um cara que curte coisas que te classificam como posição ideológica de direita”, complementa Leonardo Volpatti, “acaba vendo temas e páginas relacionadas com a direita. E isso impede o debate”, conclui. Apesar de enxergar um lado positivo e essencial no uso das redes sociais, o cientista político Leonardo e a comunicadora Luciane consideram o fato um problema a ser corrigido pelo presidente.

Por Jornalista Tácio Lorran 
Fotos Tácio Lorran

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